Wednesday, August 25, 2010

Vives perigoso

Vives perigoso, no meio de todas as tuas cautelas, e
por mais que alguém
- Abre os olhos!
hás-de sempre encolher os ombros e seguir em frente, porque se ele há coisa que tu sabes é por onde pisas. E os erros dos outros…
os erros dos outros são os erros dos outros.
Não és o único. Mas não sê-lo não te livra da mediocridade. E o haver mais cegos na terra não te alivia a cegueira.
Não te preocupes com nada! Não penses em coisa alguma. Para quê? No fim de contas já pagas os teus impostos e o que ganhas mal te dá para tabaco e cafés. Pena o preço dos livros estar pela hora da morte, e um bilhete de teatro, nem se fala! Porque senão…
senão seria Eça e Shakespeare de manhã à noite.
Assim, olha… vai uma revistinha de algodão doce ou um jornaleco desportivo.
Vives perigoso, no meio de todas as tuas certezas, e por mais que alguém
- Abre os olhos!
hás-de sempre encolher os ombros e seguir em frente, porque em frente é que é o caminho. Mas ignoras que o caminho em frente é para quem sabe para onde vai, e tu… tu andas às voltas, como o ponteiro dos segundos, preso pelo rabo, embrutecendo sem sair do lugar. E como o ponteiro dos segundos, és o que mais se cansa, porque o que importa são as horas e de ti pouco se quer saber. Tens de dar muita volta para que o barão dos ponteiros se digne a dar um passo, que esse sim é importante, apesar de pequeno e gordo. És um burro à nora, que enquanto não tirar mil alcatruzes de água não tem direito a matar a sede.
Crês que se acabou o tempo da escravatura? Nem o tronco nem a chibata se extinguiram. Mudaram-se-lhes apenas os nomes, que é assim que se enganam os tolos e não com bolos e papas como há ainda muito quem pense. E de quem é a culpa?
Diria que é desses bastardos que disparam o preço dos livros, dos bilhetes de teatro; que deixam a vida pela hora da morte. Porque senão
eu sei
senão seria Eça e Shakespeare de manhã à noite.
Mas boceja, que é o que melhor te sai da boca. Não digas nada. Não faças coisa alguma. Para quê? Não pagas já os teus impostos e não andas à rasca para tabaco e cafés?
Encolhe os ombros e segue em frente, porque em frente é que é o caminho…
o caminho do sofá, da superfície comercial, do café, do trabalho, do cemitério municipal.
Que sabes tu do mundo que te rodeia, tu que votas e te exaltas? Tu que revolucionarias a economia de um país inteiro, do mundo todo, se tos pusessem nas mãos, apesar de estares enterrado em dívidas até à última vértebra do pescoço?
A culpa é do sistema. Também concordo. Do jantar fora por sistema, do comprar roupinha de marca por sistema, do último telemóvel por sistema, de umas jantes novas para o popó por sistema, da malinha nova para condizer com a sainha nova por sistema, do ipod, do pda, do htc, do lcd, tudo xpto.
Pena o preço dos livros estar pela hora da morte e não haver bibliotecas neste país! Felizmente as revistitas de algodão doce e os jornalecos desportivos são oferta do Estado, que nem para tudo é mau o sistema.
Que sabes tu do mundo que te rodeia, tu que votas e te exaltas? Que acabarias com a guerra no mundo, mas distribuis lambada lá por casa como panfletos à boca do metro?
E de ti mesmo, que sabes tu? Saberás, por certo, mais da vida alheia, ou da de uma qualquer personagem de novela, que de ti mesmo ou de quem a teu lado enche o silêncio do quarto com roncos profundos. Mas como poderias tu saber, se tens a cabeça mareada de tanto andar à volta e o chão já te dá pela cintura… Não tardará a cobrir-te por completo.
Saberás, porventura, o porquê da tua inércia, da tua inépcia? E como se conjuga a segunda pessoa do singular do futuro do conjuntivo do verbo saber?
Quando souberes, avança… até lá
Abre os olhos!

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