- Se não larga o tabaco de hoje para amanhã, não lhe dou seis meses de vida!
O médico a querer assustar-me. É o papel deles, eu compreendo. Afinal, a não ser que
acções da Tabaqueira
que outra coisa podiam dizer? Mas se o tabaco fosse aquilo que os médicos apregoam, nenhum médico fumava, e alguns
mais que as chaminés da antiga “Cimentejo”
por isso, quando o doutor Rui
- Se não larga o tabaco de hoje para amanhã...
eu a pensar
- Tá bem, tá!
- Estes pulmões quase não se vêem! - com a radiografia diante de um painel luminoso.
Mas eu sabia que estavam lá. Sentia-os muito bem. Cada dia mais pesados, cada dia mais concretos, a dizerem-me, num amarrotar de saco de papel, “estamos aqui, sim, Eurico, não te preocupes! A propósito, não tens para ai um cigarrinho, não?”.
E eu
a propósito
até tinha
ainda que
- … de hoje para amanhã…
De modo que, mal sai do consultório, tau, um cigarrinho pós queixos; que a mim não me apanham nessa!
- Tá bem, tá!
Qualquer coisa que um homem tem
- É do tabaco!
E antes de haver tabaco? Ninguém morria, qués ver! Não sabem o que um homem tem, e então
- Estes pulmões quase não se vêem!
- Não se vêem ou você não percebe nada do ofício? - é o que dá logo vontadinha dum gajo perguntar! Mas o quê?!
Eu bem me lembro do Carlos. Todo desporto e dietas e olha, faz para o mês que vêm oito anos que um cancro no estômago o levou.
Valeu-lhe um bocado a canseira e a fome! E agora digam-me a mim que é o tabaco.
- Tá bem, tá!
Tanta corrida e tanta fruta, e olha, já lá está. Essa é que é essa! Enquanto que aqui o Eurico ainda cá anda… a carregar dois pulmões vivinhos, que bem os sinto…
Cada dia mais pesados, cada dia mais concretos, a dizerem-me, num amarrotar de saco de papel “estamos aqui, sim, Eurico, não te preocupes! A propósito, não tens para ai um cigarrinho, não?”.
De modo que, mal sai do consultório, tau… que a mim não me apanham nessa!
E apesar de Novembro, o céu particularmente carregado, numa escuridão radiográfica contra a luz fosca do Sol
- Estes pulmões quase não se vêem!
como as casas ao fundo da rua, o horizonte do Tejo. Mas que lá estão, estão; como os meus pulmões que
Cada dia mais pesados … num amarrotar de saco de papel… não te preocupes
Eu…
…rico
Portanto, o que é preciso é chegar mais perto
(O problema dos curtos de vista!
…o papel deles, eu compreendo.)
e lá estão as casa, os pulmões
Só que ninguém, para Lisboa,
- Se não larga o tabaco de hoje para amanhã, não lhe dou seis meses de vida.
Porque o mais certo era ouvirem logo
- Tá bem, tá!
Que Lisboa
(tal como eu)
não vai nisso!
O meu pai fumou até aos oitenta e quatro anos e, não fosse ter perdido os olhos antes dos pulmões, ainda hoje estaria vivo, que quem se desvia dos eléctricos a tempo vive pelo menos até aos cem. Disso é que deviam avisar as pessoas!
- Se não sai da linha agora não lhe dou seis meses de vida.
Qual seis meses?! Nem nada!
O perigo está é nessas coisas. E é por essas e por outras que eu, dos Restauradores para São Pedro de Alcântara, a penantes que é uma beleza. Que a mim não me apanham num eléctrico, nem que os pulmões
- Bem, Eurico, vamos andando. Agora é que é!
A calçada da Glória um purgatório, mas
uma paragenzinha pelo meio
um cigarrinho
A propósito…
e cá estamos nós prontos para mais uma tirada, que daqui ao Rato é um pulinho. Por isso, se os pulmões não estivessem bons, subia a calçada mas era o subias.
- E já viu essa tosse?! Parece um cão com esgana!
E eu a ver que era aí que estava o problema. O doutor Rui a perceber mais de bichos do que de gente. Acontece a muitos! Não seguiu veterinária e olhem
- …quase não se vêem! - com a radiografia diante de um painel luminoso.
como as casas ao fundo da rua, o horizonte do Tejo.
- Não se vêem ou você não percebe nada do ofício? - logo a vontadinha que dá! Mas o quê?!
Mais cinco minutos e faço-me de novo ao caminho
que as pernas
não os pulmões
que esses
… não te preocupes!
as pernas é que já não são o que eram.
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